sexta-feira, 15 de julho de 2016

SAN IGNACIO MINÍ - Missões.

Chegamos enfim a San Ignácio, o pórtico na entrada eliminava qualquer suspeita da nossa localização. Nessa viagem, seria a última Redução Jesuítica que visitaríamos (8ª), porém era nossa cereja do bolo. Considerada a Meca das Missões Jesuíticas, conhecida internacionalmente por apresentar um dos conjuntos mais preservados dos 30 povos, ganhou fama após a visita do poeta Leopoldo Lugones na região em 1903.

O complexo jesuítico fica dentro da cidade de San Ignacio que se desenvolveu com a exploração do turismo em seu entorno. A cidade cresceu ao seu redor e não sobre o sítio como aconteceu com algumas Reduções. Com o sítio arqueológico cercado, estacionamos em uma rua lateral, onde haviam várias lojas e bancas dos mais variados tipos de artesanatos...

 Com as bancas na calçada a multidão ocupava a rua toda, passei por um casal francês e após por um grupo de orientais, gente do mundo todo, locais, mochileiros com cabelo rastafári e após um grupo de indígenas que dialogavam em seu dialeto, espalhados pela calçada após o término das bancas, onde anciãs  vendiam folhagens sem as oferecer a ninguém. Antropologicamente fantástico! Uma atmosfera fascinante!

Acesso principal ao Complexo Jesuítico San Ignácio Miní.

Outro motivo que atrai bastante turistas ao local é o fato de San Ignácio estar localizada a apenas 60 Km ao norte de Posadas, capital da Província de Misiones e à 240 Km ao sul das Cataratas do Iguaçu, uma das sete maravilhas do mundo moderno.

Acessando o portão principal, passei pelo controle apresentando meu ingresso de Santa Maria La Mayor¹, pois San Ignacio Miní faz parte do "Programa Misiones Jesuiticas" com as outras 3 Reduções Jesuíticas argentinas declaradas Patrimônio da Humanidade. No programa, paga-se ingresso no primeiro sítio visitado com direito a entrada livre nos outros 3, independente da ordem, por um período de 15 dias.

No primeiro prédio logo na entrada está localizado o Museu Jesuítico de San Ignacio Miní, que abriga achados arqueológicos importantes, peças encontradas na região, bem como uma maquete da Redução Jesuítica. 

Museu Jesuítico de San Ignácio Miní.


Relógio de Sol e peça esculpida em arenito.


Maquete da Redução Jesuítica de San Ignacio Miní.

As Ruínas de San Ignacio Miní foram declaradas:
  • Monumento Histórico Nacional (Argentina) - 1943
  • Patrimônio Histórico Cultural Provincial (Misiones) - 1983.
  • Patrimônio da Humanidade (UNESCO) - 1984.
No sítio há vários totens espalhados entre os diferentes setores da Redução, os quais fornecem informações do respectivo setor no qual se está visitando, como por exemplo: o tipo de construção, o que era realizado, informações do cotidiano, etc. As informações são disponibilizadas em 5 idiomas (espanhol, português, inglês, francês e alemão), através de uma caixa de som localizada na parte inferior do totem.

 
Placa com o reconhecimento de Patrimônio da Humanidade e totem informativo.

Em 1984, quatro sítios arqueológicos jesuíticos foram declarados como Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO na Argentina, são eles:
  • San Ignacio Miní.
  • Santa Maria La Mayor¹.
  • Santa Ana².
  • Nuestra Señora de Loreto³.

Outras três Reduções Jesuíticas foram declaradas Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, uma no Brasil e duas no Paraguai, que com as da Argentina somam um total de sete, são elas:
  • São Miguel Arcanjo - Brasil (declarada em 1983).
  • Jesus de Tavarangue - Paraguai (declarada em 1993).
  • Santísima Trinidad del Paraná - Paraguai (declarada em 1993).

Após a visita ao museu segue-se um caminho calçado com pedras que leva a um portão ou seria um portal?! Pois a partir dele você é transportado a uma viagem a mais de 300 anos atrás. Placas, totens, guias especializados ou a sua imaginação somada com conhecimento ou não, farão o teletransporte.

A partir desse ponto está desenhada Redução Jesuítica Guarani de San Ignacio Miní.

Ao ver a imagem acima pode-se ver a entrada principal da Redução que leva à Praça principal e mais a frente desta, a Igreja. Até o grande gramado da Praça principal na esquerda e direita do caminho estão as ruínas das casas dos índios. Tiras compridas de construções divididas em peças onde cada uma dessas abrigava uma família guarani. As colunas ao redor das construções é o que sustentavam as áreas cobertas em torno das mesmas. 

 
Sítio Arqueológico San Ignacio Miní.


Casa dos Índios - San Ignacio Miní.


Ruínas das casas dos índios (viviendas).


É possível observar a divisão nas longas tiras, onde cada uma divisão abrigava uma família guarani.

Durante os séculos XVII e XVIII (entre 1609 a 1818), aconteceu um dos mais impactantes episódios da história da humanidade: As Missões Guaranis, uma experiência social, cultural e religiosa única no seu tipo, iniciada pela Companhia de Jesus, a serviço da Coroa Espanhola, que fundou 30 Reduções em terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, situadas nos atuais Paraguai, Argentina, Uruguai e Brasil.

Simbolo da Companhia de Jesus


San Ignacio Miní - Misiones / AR.


Ruínas de San Ignacio - Argentina.

Os 30 povos erguidos pela Companhia de Jesus no século XVII na Província Jesuítica do Paraguai, na atualidade, estão distribuídos respectivamente em 15 povos na Argentina, 8 no Paraguai e 7 no Brasil. São eles:
  • ARGENTINA: 
Nuestra Señora de Loreto (1610), Concepción de la Sierra (1619), Corpus (1622), Santa María la Mayor (1626), Yapeyú (1627), San Javier (1629), La Cruz (1630), San Carlos (1631), San Ignacio Miní (1632), Santo Tomé (1632), Nuestra Señora de Santa Ana (1633), Candelaria (1637), Apóstoles (1638), San José (1638) e Mártires (1639).

  • BRASIL (Os 7 Povos das Missões):
São Francisco de Borja (1682), São Luiz Gonzaga (1687), São Miguel Arcanjo (1687), São Nicolau (1º ciclo 1626 - 2º ciclo 1687), São Lourenço Mártir (1690), São João Batista (1697) e Santo Ângelo Custódio (1707).

  • PARAGUAI:
San Ignacio Guazú (1609), Encarnación de Itapua (1615), San Cosme y Damián (1632), Santa María de Fe (1647), Santiago (1651), Jesús de Tavarangue (1685), Santa Rosa de Lima (1698) e La Santísima Trinidad del Paraná (1706).

Os 30 Povos das Missões.


San Ignacio Miní - Misiones / Argentina.


Redução Jesuítica de San Ignácio Miní - Casa dos índios.

Em San Ignacio Miní é possível visualizar a materialização do que contam os relatos e os livros, no que diz respeito as casas dos indígenas, as divisões das tiras estão incrivelmente preservadas, na imagem abaixo, mais uma vez é possível observar a divisão nas longas tiras, onde cada uma divisão abrigava uma família guarani.

Como apresenta Lessa (2005, p. 89,90) "Cada residência é um quadrado de alguns metros. São casas sem chaminés, pois os índios não gostam disso. Gostam é de ficar no meio da casa, semi-acocorados em redor do fogo, que a todos aquece. A fumaça deixa o teto encardido de picumã".

Divisões das casas dos índios.

A Redução Jesuítica de San Ignacio Miní teve sua origem em 1610, e foi fundada pelos Jesuítas José Cataldino e Simón Masceta no norte do atual Estado do Paraná / Brasil na região de Guaíra (os nativos chamavam de Guayrá), próxima a mais 10 Reduções. 

Em 1632 obrigou-se a mudar-se junto com Loreto (as únicas a resistirem aos ataques) por causa da destruição por parte dos Bandeirantes Paulistas ou Mamelucos que vinham capturar indígenas para serem vendidos como escravos. Se restabeleceram as margens do arroio Yabebirí, na atual província argentina de Misiones.

Em 1696 se estabeleceu definitivamente no local onde encontram-se as suas ruínas. 

Praça Central em frente a igreja.


Ruínas da igreja de San Ignacio Miní - Argentina.
Porta principal da catedral - Acima das colunas de sustentação, anjos esculpidos na pedra, típica arquitetura missioneira (Barroco-Guarani) com pedras arenito e basalto.
Bem ao centro havia um arco que ligava as colunas de sustentação, duas portas secundárias nas laterais faziam a frente da catedral com 3 entradas em arcos, a do centro maior e as laterais menores.


San Ignacio Miní - Patrimônio da Humanidade / UNESCO.


Os detalhes impressionam, bem como o seu atual estado de conservação.

A sua magnífica igreja mede 74 metros de comprimento por 24 metros de largura e foi desenhada pelo jesuíta italiano Juan Brasanelli, o qual a construiu utilizando arenito vermelho local. A largura de suas paredes são de aproximadamente dois metros, que apesar do arenito ser um material frágil, tendo essa dimensão às sustentam por mais de 300 anos.

Redução Jesuítica de San Ignacio Miní - Interior da igreja.

O interior inteiro da igreja é calçado, algumas áreas tem restrições de passagem devido a diminuição do impacto pela demanda de visitantes, mas toda ela é passível de observação. Algumas escoras metálicas poluem visualmente, porém é um trabalho de restauração importante.

Interior da Igreja.

A Redução de San Ignacio Miní foi totalmente restaurada na década de 1940 aos comandos do Arquiteto Carlos Luis Onetto falecido em abril de 2005 aos 93 anos. Onetto escreveu o livro SAN IGNACIO MINÍ: Un testimonio que debe perdurar (1999). Em 2003 teve outra restauração importante e atualmente é a Missão Jesuítica mais preservada da Argentina.

Redução Jesuítica de San Ignacio Miní.

O nome San Ignacio "Miní" que dizer "Menor" em Guarani para diferenciá-la da Redução maior San Ignacio "Guazú" = "Grande".

Localização do altar da grande catedral.


A símbolo da Companhia de Jesus esculpida na pedra.
IHS = Em sentido Latino:
"I" - Iesus (Jesús), "H" - Hominum (de los hombres), "S" - Salvator (salvador).
Iesus, Hominum Salvator = Jesús, Salvador de los Hombres = Jesus, Salvador dos Homens (humanidade).
Os 3 cravos do escudo da companhia se referem a crucificação e representam os votos da companhia: Pobreza, Castidade e Obediência.

Restrições diminuem o impacto.

A planta da Redução Jesuítica de San Ignacio Miní é comum à maioria das construídas pelos jesuítas: Uma grande praça central, em destaque à frente da praça, a igreja. Quem a aborda pela frente no lado direito da igreja fica o Cemitério e mais ao lado o Cotiguazú (Casa Grande - onde viviam viúvas, órfãs, etc) . Do lado esquerdo da igreja fica o Colégio com seu pátio e seus aposentos, mais a esquerda ficam as Oficinas. mais atrás dessas construções no fundo da Redução ficava a Horta. Em volta da praça cercando-a ficam em primeiro plano o Cabildo (espécie de Câmara Legislativa onde as lideranças indígenas tomavam algumas decisões importantes) e a morada dos caciques, logo atrás ainda cercando tudo, ficam as casas dos indígenas. Na entrada principal da praça ficavam duas capelas menores. 

Passagem da igreja para o Claustro.

Lápide com motivos simbólicos acima da porta do Claustro incrivelmente esculpido na pedra arenítica. No centro o símbolo da Companhia de Jesus.
(Saiba mais sobre essa representação no Blog da Dra. Arq. Graciela Kuna no final da postagem).


Pátio do colégio, visto saindo na lateral da igreja, o mesmo é fechado nos quatro lados incrivelmente preservados.

Essa parte é realmente surpreendente, caminhar por esses corredores calçados a mais de 3 séculos com as construções de um lado e do outro um imenso gramado plano e bem cuidado, todo cercado, faz a imaginação trabalhar tão forte a ponto de esperar cruzar com um padre jesuíta a qualquer instante.

Aposentos do Claustro.

Pórtico da sacristia ou aposento dos padres.


Varanda calçada dos aposentos do Colégio.


A visão da construção e do grande pátio interno.


Aposentos da cozinha - adega (protegida).


Adega em San Ignacio Miní.

Cada grupo familiar cultivava uma parcela de terra (abambaé = coisas do homem) e outra comunitária (tupambaé = coisas de Deus). Os homens faziam os trabalhos rurais, de carpintaria, ferraria, arte e artesanatos, eram professores de ofício. As mulheres cuidavam das crianças, cozinhavam, teciam e tinham de sua responsabilidade as tarefas domésticas.

Escadarias conduziam à horta nos fundos da redução.


Detalhes das lajotas no piso com mais de 300 anos / fantástico!!!!!


Os fundos da Redução.


San Ignacio Miní - Patrimonio de la Humanidad.

Todos participavam dos trabalhos artísticos e religiosos. Com os lucros da produção de Tupambaé sustentavam as mulheres sozinhas do Cotiguazú e sustentavam gastos da igreja, da educação e de outras expressões culturais.

Pátio das Oficinas também cercado pelos quatro lados.


Passarela interna - San Ignacio Miní - Misiones / Argentina.


Pátio interno do Colégio - Claustro.


Passagem para as oficinas.


Sítio Arqueológico de San Ignacio Miní.


Oficinas.


San Ignacio recebe excursões de todas as partes.

Fazendo o caminho inverso do que entrei, segui caminhando lentamente, ainda encantado com o que via, com a fusão natureza e história, com o estado de preservação das construções enfim com a materialização de tudo que em outras reduções somente imaginava, principalmente no diz as construções dos indígenas, o alinhamento entre as casas, entre as colunas... é tudo incrível!!!!!!!

Esta árvore é chamada "Corazón de Piedra", pois a coluna está dentro da árvore!


San Ignacio Miní - Incrivelmente preservada!

Na sua atual localização terminou por ser destruída pelos ataques paraguaios (já independentes) em 1817 e posteriormente saqueada. 

Ruínas de San Ignacio Miní - Patrimônio da Humanidade / Argentina.

San Ignacio Miní foi o último sítio arqueológico que visitamos nessa jornada, foram 4 na Argentina e 4 no Brasil, as Reduções do Paraguai serão visitadas em uma próxima oportunidade a qual já estamos planejando. Nos links disponibilizados abaixo estão compartilhados nossa passagem pelas respectivas Reduções Jesuíticas. Estar em lugares como esses foi uma experiência fantástica que nos acrescentou conhecimento e nos enriqueceu culturalmente. Ficamos devendo as Reduções do Paraguai, mas em breve pagaremos a conta. Um Grande Abraço a Todos!!!!!!!



SAN IGNACIO MINÍ - O CONJUNTO MAIS PRESERVADO DOS 30 POVOS, NOS LEVA A UMA VIAGEM NO TEMPO A MAIS DE 300 ANOS / PATRIMÔNIO DA HUMANIDADE!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! 




COORDENADAS GOOGLE EARTH: 27º15'17.65"S - 55º31'54.64"O.



TEXTO:
Adaptação - Valfredo Neves.

Fonte - Wikipedia, Folders Turísticos, Pesquisas Relacionadas.

Referência:
LESSA, Luiz Carlos Barboza. São Miguel da Humanidade: uma proposição antropológica. Porto Alegre: Alcance, 2005.


FOTOS: Valfredo Neves.



VEJA MAIS EM:




REDUÇÕES NO BRASIL:





VEJA TAMBÉM:
Blog da Dra. Arq. Graciela Kuna - "El friso de las sirenas de San Ignacio"


FILME SOBRE AS MISSÕES JESUÍTICAS RECOMENDADO:


LIVRO SOBRE AS MISSÕES JESUÍTICAS RECOMENDADO: